Braga: Colégio D. Diogo de Sousa: Finalistas (12.º) deixam saudades

O actor Pedro Lamares e a arte dos 140 alunos do 12.º ano — finalistas — proporcionaram mais um delicioso sarau cultural no Colégio Dom Diogo de Sousa, levando o director da escola a exclamar: “ides deixar saudades”. A surpresa bem guardada foi uma sessão de fogo de artifício a fechar a noite.

O Padre Cândido de Sá saudou todos os intervenientes e classificou como “ditosa a escola que tem estes alunos” pois “ficamos maravilhados com a vossa arte, entre dança, poesia, teatro, pintura e música”,

Sem esquecer o trabalho dos alunos de artes — patente numa exposição no hall de entrada da escola — o Director do Colégio enalteceu as “ditosas famílias que têm estes filhos assim” e lembrou os “excelentes professores que preparam esta noite memorável”, coordenada pelo Departamento de Português e Latim, dirigido pela prof. Sandra Mesquita.

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Quanto à prestação do “fraseador” Pedro Lamares, o padre Cândido não poupou as palavras porque “gostamos todos e ficamos extasiados com a qualidade da sua dicção, a sua memória e aceitamos as suas provocações”.

Dirigindo-se aos alunos, elogiou a coragem de “pegar n’Os Lusíadas, porque mesmo que não saia no exame, ficaram a saber mais Camões e nós ficamos a gostar mais da nossa Epopeia”. “Ides deixar saudades e a forma como as turmas do 12.º ano trabalharam juntas é muito bonita”.

O Padre Cândido agradeceu aos professores e pais que ajudam o Colégio Dom Diogo de Sousa a “preparar jovens para serem vencedores na vida e fica na boca o gosto de saber a pouco”.

O sarau começou com uma brilhante interpretação de Carolina Assunção e Francisca Soares da canção que venceu o Festival da Eurvisão, “Amar pelos dois”, de Salvador Sobral, acompanhadas por um quinteto de cordas e piano.

Depois Pedro Lamares encheu o palco com a recitação de poemas de vários escritores portugueses, dando corpo ao seu projecto “Entre nós e a poesia” que tem levado a muitas escolas portuguesas.

Este “fraseador” — como gosta de ser tratado — evocou as certezas da sua juventude quando desejava ser psicólogo, cozinheiro ou poeta e piloto de aviões e acabou por ir estudar teatro, motivado pelos poemas de “Alberto Caeiro (heterónimo de Pessoa … especialmente o livro “Guardador de Rabanhos”. Nessa altura proibiram-lhe a leitura do livro, o que o entusiasmou à desobediência porque “pensar não é compreender, pensar é estar doente dos olhos”, ou Quem ama não sabe porque ama, o que ama, nem o que é amar”.

A sua missão é colocar a poesia no centro da educação dos jovens até porque à necessidade competitiva das notas, Pedro Lamares releva a “avaliação qualitativa face à quantitativa”

A viagem de Pedro Lamares passou por poetas pouco conhecidos, como o bracarense Jorge Sousa Braga, médico no Hospital de Santo António, no Porto, com o seu poema “Portugal”, que é “esse corpo cheio de pontos negros para eu poder espremer à vontade”.

É em Manuel de Barros e nas suas “Memórias inventadas” que ele encontra a palavra que melhor o define: “fraseador”, em vez de recitador, declamador ou “diseur” de poesia.

Depois de citar Ana Luísa Amaral , Pedro Lamares dedica a segunda parte aos dois temas mais frequentes na poesia, o amor e a morte. Socorre-se de Gil Vicente, Luís de Camões, Fernando Pessoa e António Lobo Antunes, para quem “Todos os homens são maricas quando estão doentes”.

Pedro Lamares esclareceu que Fernando Pessoa nunca recolheu as pedras do caminho para com elas construir um castelo, dado tratar-se de um erro atribuí-lo ao autor de “A mensagem”. Esse poema pertence ao brasileiro Osvaldo Montenegro).

Seguiu-se o poema “Vem à quinta-feira”, de Filipa Leal, poeta que faz com ele o programa “Literatura aqui”, na RTP 2, e espectacular poema de Valter Hugo Mãe intitulado “Coisinhas preciosas para meter no cu” que agitou o auditório quando o menino do poema grita: “quero me matar porque o meu pai me bate por eu brincar com as bonecas da minha irmã” (cf. http://revista-aberta.blogspot.pt/2009/05/coisinhas-preciosas-para-meter-no-cu.html).

A provocação final estava bem guardada: o Poema VIII de Alberto Caeiro, também conhecido pelo título “Vi Jesus Cristo descer à terra”, que mereceu uma enorme ovação das várias centenas de pessoas na sala. (cf. http://www.citador.pt/poemas/vi-jesus-cristo-descer-a-terra-alberto-caeirobrheteronimo-de-fernando-pessoa). Um ensurdecedor silêncio final foi cortado, de repente, por uma entusiasmada salva de palmas.

Pedro Lamares mostrou-se grato pela “cumplicidade, sorriso e aplausos do Grupo de Português e Latim” que se atreveu a “convidar um tipo que é um provocador, com coragem, abertura e generosidade”.

Depois seguiu-se uma girândola de momentos artísticos que evocaram quadros de Os Lusíadas, como o Velho do Restelo, Concílio dos deuses, Inês de Castro e Pedro, chegada à Índia, Adamastor, Ilha de Venus e chegada a Lisboa, através da dança, da música, do teatro e declamação de extratos da Epopeia portuguesa.

PEDRO LAMARES:

Poesia é um motor de pensamento crítico

Pedro lamares mostrou-se impressionado com “este trabalho muito meritório de tatos alunos e professores, nas várias disciplinas que confluem para um espaço de celebração de enorme qualidade que vivemos hoje”.

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Há aqui a “vivência de uma história, com uma narrativa, uma união e a valorização das artes, envolvendo professores e alunos, o que é muito relevante” — prosseguiu Pedro Lamares Gama da Rocha nascido a 2 de Março de 1979 em Portimão. Na juventude, vem para Espinho, estuda artes plásticas, passa pela escola de jazz do Porto (1996/7), frequenta o curso de preparação para licenciatura em música sacra, na Universidade Católica do Porto, sob orientação do Cónego Ferreira dos Santos (1997/98).

Pedro Lamares estudou teatro (interpretação) na Academia Contemporânea do Espectáculo e na Natural Theatre Company, de Inglaterra, e voz (Bernard Messuir, da Bélgica).

Tem participado em espectáculos de teatro, dança e poesia.

Na televisão deu-se a conhecer em Dei-te Quase Tudo (2005), participando, de seguida, em Paixões Proibidas (2006), gravada no Brasil. Na TVI participou ainda em Casos da Vida (2008), Olhos nos Olhos (2008) e Sentimentos (2009). Na RTP, integrou o elenco de Pai à Força (2009). P

Representa Pessoa no filme, Filme do Desassossego. Em 2015, é convidado apresentar o programa (Literatura aqui) sobre poesia, na RTP 2, em colaboração com a jornalista e poeta Filipa Leal.

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Simultaneamente, tem um projecto “na estrada, há 15 anos, “Entre nós e as palavras” que percorre as escolas secundárias do país com dois objectivos centrais: “incentivar a leitura, com foco na poesia, e utilização da poesia como motor de pensamento crítico e usar a poesia para levantar questões” — explicou Pedro Lamares, no fim do sarau.

Agostinho Domingues: Mestre e combatente da Liberdade

Faleceu ontem o prof. Doutor Agostinho Domingues, protótipo da grandeza humana, um filho ilustríssimo de Amares, um grande apaixonado pela literatura portuguesa e um combatente da democracia.

O seu funeral, com missa de corpo presente, realiza-se quinta-feira, dia 4 de Maio, às 10 horas, na Igreja de Santo Adrião, em Braga. Amanhã, quarta-feira, o seu corpo encontra-se em câmara ardente.

Nascido em 1940, em Santa Maria de Bouro, Amares, Agostinho de Jesus Domingues, fez os seus primeiros estudos da Escolaridade elementar em Bouro, ingressando depois para frequentar os cinco primeiros anos do secundário em seminários da Companhia de Jesus.

Antes de ser professor dos liceus em em Braga e Vila Real, concluiu a licenciatura em Coimbra e o Mestrado em Braga.

Foi professor do ensino secundário (Escola Sá de Miranda, em Braga) onde colocou ao dispor das centenas de alunos que o tiveram como Mestre os conhecimentos da sua Licenciatura em Filologia Românica pela Universidade de Coimbra e do seu Mestrado em Língua e Literatura Portuguesa pela Universidade do Minho.

Ao longo da sua carreira foi vice-reitor do ex-liceu de Barcelos, membro de conselhos directivos e inspector regional (Inspector superior) para a Educação nos distritos de Braga e Viana do Castelo.

Além de Mestre de várias gerações e regular colaborador dos jornais Diário do Minho e Correio do Minho, Agostinho Domingues dedica a sua vida ao combate pela democracia, tendo sido Deputado à Assembleia Constituinte e à Assembleia da República, em vários mandatos; foi vereador da Câmara de Amares entre 1976 e 1989. Foi também membro da Comissão Nacional do Partido Socialista Assembleia da República, em vários mandatos;

Do seu estudo e investigação deixa-nos várias obras, como apaixonado que era pelo seu conterrâneo Francisco Sá de Miranda. Entre elas destacamos, Homenagem a Sá de Miranda, Amares, 1987; Pessoa/Persona, Amares, 1988; A Comédia de Rubena de Gil Vicente, em co-autoria, Amares, 1988; Cantigas de João Garcia de Gilhade, Barcelos, 1992 (versão para o grande público da tese de mestrado).

Da sua vasta colaboração herdamos de Agostinho Domingues “Textos para teatro” (sobre Sá de Miranda, Antero de Quental e Almada Negreiros) , palestras e artigos em revistas e jornais, nomeadamente nos diários Correio do Minho e Diário do Minho e na revista O Escritor.

Destas publicações destaca-se a colectânea — dedicada a José Ferreira Salgado, outro companheiro de batalhas pela democracia — “O Infante D. Henrique, entre a história e a literatura” (capa e contra capa nas fotos), editada pela Arcada Nova, em 1999. Damião de Góis foi outro dos renascentistas a quem dedicou especial atenção, através de uma série de dez crónicas publicadas no jornal Correio do Minho.

Citando o seu poeta preferido, que estudou até aos últimos dias de vida, hoje apetece-nos dizer, sem saber se o havemos de chorar “porque nos deixaste, se cantar por entre mortais ver-te divino“.